terça-feira, 22 de janeiro de 2013

A normalidade da mentira

A anormalidade tende cada vez mais a ser normalizada neste país devastado, explicando melhor, comportamentos considerados éticamente incorrectos mas repetidos muitas vezes sem que daí advenham consequências de maior, por via dessa repetição impune, passam a ser socialmente aceitáveis e portanto normais.

Tomemos o exemplo recente do pedido de mais tempo para pagármos a dívida. O governo que repetidamente afirmou que nunca pediria nem mais tempo nem mais dinheiro aos credores, veio agora na reunião do eurogrupo pedir mais tempo numa viragem de 180 graus, isto é, fez exactamente o contrário do que sempre afirmou, mentindo descaradamente aos portugueses ao longo da legislatura. De resto, também as promessas eleitorais foram em grande medida desrespeitadas, acontecendo que inúmeras pessoas que votaram no PSD e no CDS se sintam enganadas. 

Estranhamente a sociedade não reage ou concede pouca atenção à mentira e ao logro sistemático praticados pelos políticos, integrando pacificamente a prática, que passou por via do consentimento acrítico a fazer parte do universo do normal. Os próprios políticos justificam a mentira, os desvios, a ocultação, a manha, a esperteza saloia, com o postulado de, como já variadíssimas vezes vi e ouvi, " faz parte da política " ou "é a política", numa atitude de menorização dos atropelos à moral e à ética.

Decorre portanto que , toda a construção  governativa e de um modo geral o edíficio político/partidário nacional, com algumas excepções evidentemente, assenta num modelo pouco ético e moral, contando com a complacência e a resignação da generalidade dos cidadãos. Estamos perante um  relativismo acrítico e imoral que ratifica a ilegalidade da mentira e do logro, e que é em grande medida gerador da corrupção impune que atravessa a sociedade portuguesa.

A origem da crise económica, social e política está, em última análise, radicada neste tipo de comportamentos, não se vendo fim à vista, antes pelo contrário, já que constituídos em  prática corrente influenciam, decisivamente pelo exemplo as gerações mais novas.

Pessoalmente sou um resistente, procuro o mais possível não ser contaminado pela doença, mas   cada vez mais tenho dificuldade em confiar e acreditar nas instituições, cada vez mais  o vazio da desconfiança me atormenta, e não gosto, não gosto mesmo nada de assistir à degradação de valores que eu julgava intocáveis e intemporais.

jotacmarques