Há para aí um programa televisivo chamado "Eixo do mal", que passa na Sic Notícias aos sábados a dar para o tarde, onde quatro comentadores debitam regra geral baboseiras que pretendem abordar a política numa lógica de humor. O resultado é mais ou menos desastroso, mas ontem, Clara Ferreira Alves, de longe a mais esperta e assertiva do bando, falou a sério e produziu uma ideia muito interessante a propósito do derrube dos governos impopulares. Disse ela que, na Grécia e em Portugal as manifestações de rua parecem não produzir grandes resultados, já que no primeiro está tudo na mesma e cá não é melhor, como se a "normalização" do que é excepcional lhe banalizasse e enfraquecesse o conteúdo. Na opinião da Clara, o que se tem passado no Egipto na praça Tahrir, onde multidões enormes de populares ocupam dias e dias a praça em protesto contra os governos, até que Mubarak se demitisse, ou, mais actualmente, contra o presidente Morsi e a lei que lhe confere poderes ditatoriais, tem sido a fórmula de manifestar o descontentamento dos cidadãos que produziu os resultados mais notáveis relativamente aos objectivos pretendidos.
Ferreira Alves considera que os países Europeus se deviam debruçar com mais atenção sobre estas experiências de cidadania dos povos islâmicos e aprender com elas. O ocidente que insiste em exportar os seus modelos para todo o Mundo, a maioria das vezes forçadamente e sem resultados animadores, talvez tenha que aprender com as práticas actuais dos anteriores colonizados, infere-se da posição de Clara F. Alves.
A ideia é interessante e muito pertinente, mas há que contextualizar. De facto, o que se tem passado no Cairo tem contado com a complacência da polícia e do exército, que fazem vista grossa às concentrações populares, ou pelo menos não se abatem ferozmente sobre as pessoas. Em Portugal , na Grécia e em Espanha as coisas não se passam assim, as cadeias de comando político-militares funcionam e ainda não se degradaram como no Egipto. Provávelmente virá a acontecer a implosão das cadeias de comando a curto ou médio prazo, se a situação se degradar muito, as exigências da repressão se acentuarem, e se tornem intoleráveis para a polícia, cujos efectivos também sofrem na pele os efeitos da crise tal qual os demais cidadãos.
Então sim, transformar as praças europeias à semelhança de Tahrir, ou prosseguir o que aconteceu em Madrid nas Portas do Sol, sem que a polícia de choque espanque gente indefesa, é muito possível e desejável.
Até lá continuemos a afirmar a nossa revolta em manifestações de rua, em grandes protesto como o de 15 de Setembro, sem partidos a creditarem e a manipularem o descontentamento.
jotacmarques
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