sexta-feira, 22 de junho de 2012

Ronaldo o D. Sebastião do nosso tempo

Desde o sec.XVI , após o desastre de Álcaçer Quibir, que o imaginário português assimilou o fantasma de D.Sebastião. A morte ou desaparecimento do rei na batalha,  deixando o vazio na coroa portuguesa,  com a possibilidade que se veio a concretizar de Filipe de Espanha ocupar o trono de Portugal, desencadeou o mito sebastianista. D Sebastião desaparecido, viria do nada numa manhã de nevoeiro para nos libertar do jugo de Espanha. Desde então, de  há mais de  quatro séculos, que esperamos com esperança que das brumas apareça o " Rei " que nos venha salvar dos apertos. A mobilização do povo português tem acontecido mais à volta de figuras providenciais do que  em torno de grandes objectivos nacionais. A incapacidade de se definir um projecto nacional desde os descobrimentos é a constante, e o povo fica ávido de alguém que o tire do lodaçal da crise endémica. Fontes Pereira de Melo e Salazar são dois exemplos que se afirmaram com sucesso por via desta " filosofia ".

Na actualidade,  há uma transferência para os futebolistas do mito sebastianista. Os heróis capazes de resolverem o nosso complexo de incapacidade são os grandes jogadores de futebol, nomeadamente Cristiano Ronaldo. Ronaldo com o seu enorme sucesso é o "objecto de trasferência " de um povo perdido e deprimido, que sofre uma crise profunda e que não vê nos políticos que o têm governado, ou desgovernado, capacidade de o arrancar do buraco negro. Numa sublimação apoteótica,  assiste-se a um povo que incapaz de se mobilizar  no essencial, que seria a revolta contra as iniquidades a que está a ser sujeito e contra o recuo civilizacional, desflralda bandeiras nas janelas e nos quintais, canta em uníssuo o hino nacional em casa e nos locais públicos, antes do começo de mais uma exibição da selecção nacional. O país pára sempre que há jogo, para todos em conjunto " sofrerem " , ministros e figurões importantes vão à Polónia assistir ao jogo,  os orgãos de comunicação social não falam de outra coisa, o seleccionador nacional Paulo Bento é quem tem  mais tempo de antena no país, num repisar de opiniões e declarações de banalidades sem qualquer interesse. 

Espantosamente para mim e espero que para mais uns quantos, parece que o grande desígnio da nação é pura e simplesmente que Portugal ganhe o campeonato europeu de futebol.

A desporporção  da realidade e dos sentimentos foi sempre e é um apanágio dos portugueses, somos exagerados e/ou redutores, somos de excessos, mas isto é demais num país à míngua e com outras prioridades. Este desvio da atenção para o futebol , esta desvirtualização da ordem de prioridades,  que relega para outro plano o  essencial  no  país e na Europa, é grotesca e de uma enorme custo para todos nós. O governo evidentemente agradece e promove, e entretanto as alterações ao código de trabalho já foram promulgadas e  o ministro Vítor Gaspar declara no estrangeiro que é possível que novas medidas de austeridade venham a se adoptadas para contenção do déficit público.

E nós? Nós o que é que fazemos? Nada! Népia! Vemos futebol na televisão!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Uma desgraça, uma autêntica desgraça, para nós e para o infeliz do Ronaldo que tem que arcar com as felicidades e infelicidades do seu povo!

jotacmarques  


 

2 comentários:

  1. Para mim o ronaldo é mais um "namoradinho" de portugal, um produto de mercado, é como comer um gelado para esquecer. Nada melhor que
    um namoradinho para fazer esquecer as crises.

    E afinal, não foi assim nos anos trinta?

    Dancemos o Charleston, o Ronaldston, let´s dance!

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  2. Pois, pois! Só lembro que há coisas que nunca devem ser esquecidas, o recuo de um modelo social por exemplo. Aqui e agora o essencial é a prioridade, o resto são vaidades, alienação da realidade. Não tem mal aliviar a tola, mas quanto a fazerem-nos a cabeça, a tola quer-se dizer, aí é que não alinho...nem que seja a dançar!

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